Uma senhora pequenina fez parte da história da cidade. “O que faltava em tamanho sobrava em alegria”, diziam ao falar de Maria Freire Lourenzeti, a “Rainha do Carnaval” maringaense nos anos 1950. Ficaria eternizada com o apelido de “Donzinha”.
Naquela época, existia o Clube Moicano, no Maringá Velho - atrás de onde hoje é o Colégio Santa Cruz - comandado por Chocolate, e o Clube Operário, na Vila Operária. Era nesses locais que muitos maringaenses pulavam carnaval.
Os preparativos eram feitos com bastante antecedência. Donzinha sempre preparava a sua fantasia com pano de chitão. Já a maioria dos homens usava calças pretas e camisas listradas.
Os bailes começavam às nove da noite e não tinha hora para acabar. E o lança-perfume rolava à vontade. Ainda não era proibido.
Donzinha nasceu na cidade de Mamanguape, Paraíba. No final dos anos 1940, ela foi para o Rio de Janeiro na terceira classe de um navio que saiu do porto de Cabedelo. Estava grávida e viúva. Durante o trajeto, começou a passar mal.
Quando o comandante descobriu a gravidez, chamou a família de Donzinha e explicou que a levaria para a primeira classe para receber os devidos cuidados, mas caso ela falecesse, o corpo teria que ser atirado ao mar.
Donzinha acabou chegando bem no Rio de Janeiro e ficou feliz em ter estado na primeira classe do navio, pois lá tinha comida para alimentar a irmã e o cunhado que viajavam com ela. O filho nasceu meses depois.
Ao desembarcar na então capital federal, foi trabalhar como doméstica na casa da cantora Dalva de Oliveira, casada com o compositor Herivelto Martins, pais dos também cantores Peri Oliveira Martins, o Pery Ribeiro, e Ubiratan Oliveira Martins.
Dalva era uma cantora de carnavais e isso influenciou ainda mais a Donzinha, que, entre suas atribuições, cuidava do menino Pery Ribeiro.
Na capital da antiga Guanabara, a irmã a convenceu para que se mudasse junto com o filho para o interior do Paraná. Donzinha chegou em Maringá no ano de 1952.
Em terras vermelhas, tornou-se a primeira rainha do carnaval maringaense, eleita graças à amizade que tinha com vereadores, pois trabalhou 27 anos como zeladora na Câmara Municipal. Naquele período, a rainha era escolhida como hoje se escolhem as sinhazinhas: vendendo talões, os quais os vereadores compravam fechados.
"Desde criança ela gostava muito de carnaval, mas seus pais eram muito católicos e viam a festa da janela, não deixavam os filhos entrarem nos blocos. Um dia, aos 2 anos, fez uma máscara de papel e se fantasiou para não ser reconhecida pelos pais. Desfilou e até deu tchau para os pais, mesmo suando e a máscara se desfazendo", conta a nora Tiana Lozencetti.
Donzinha era uma mulher alegre, que gostava de dançar, cantar, tocar pandeiro e fazer repente. Desafiava as pessoas para a rima e sempre ganhava. E foi num baile de carnaval que ela conheceu seu segundo marido, o sanfoneiro Pascoal. Com ele, teve mais dois filhos. Donzinha também foi enredo da escola de samba Unidos da Vila Operária e chegou a desfilar pelo centro no carro principal.
"Quem não a conheceu perdeu a chance de conhecer uma grande mulher, que amava a vida e dividia tudo o que tinha", recorda a nora. "Para mim, falar nela é falar em alegria. Aonde ia, encantava as pessoas. Ela que comprou minhas alianças e incentivou meu casamento com seu filho. Até o último momento ela manteve o humor", conta.
Também era uma pessoa política. Vibrava e torcia pelos seus candidatos, chegava a subir para cantar em palanques, mas, mesmo tendo seus favoritos, não perdia a amizade de ninguém: foi também com a ajuda dos vereadores que arrecadou dinheiro para voltar ao Nordeste para buscar sua mãe.
"Ela dizia que quem tem amigos não precisa de dinheiro. Alguns médicos a atendiam de graça, a qualquer hora do dia", lembra Tiana. Um desses médicos viu Donzinha falecer em seus braços, aos 77 anos, sem cumprir a promessa de que lhe ensinaria a dançar forró. "As enfermeiras disseram que nunca viram aquele médico tão triste". Antes de morrer, ela deixou uma recomendação: "Ninguém vai chorar no meu buraco".
A “Rainha do Carnaval” morreu em 1997, em decorrência da Síndrome de Guillan Barré, doença rara que paralisa gradativamente os nervos.
Fontes: O Diário do Norte do Paraná de 18 de fevereiro de 2007 / Radio CBN – Vozes da História de março de 2006 / Acervo Museu Esportivo de Maringá / Acervo Familia Lorenzetti / Acervo Maringá Histórica.